sábado, 4 de agosto de 2007

Cascaliana #2 - João Sarmento Pimentel

BREVE REFERÊNCIA AO MAR DE CASCAIS
NAS MEMÓRIAS DO CAPITÃO

João Maria Ferreira Sarmento Pimentel (Eixes, Mirandela, 1888 -- São Paulo, 1987).

Oficial do Exército, escritor memorialista, fidalgo republicano, Sarmento Pimentel é uma das mais apaixonantes figuras do século XX português. Oriundo da velha aristocracia nortenha, participou em alguns dos mais importantes lances da história de novecentos, com um papel de grande destaque. Não ainda na Rotunda, em 5 de Outubro de 1910, jovem cadete subordinado. Mas em 1915, na guerra de África contra os alemães, teve intervenção importante na reconquista de Naulila, sul de Angola, em 1915, comandando um destacamento luso-boer, e passa pelo inferno das trincheiras da Flandres. Em Portugal, tendo colaborado com Sidónio Pais, será o chefe das forças que põem fim à Monarquia do Norte, em Fevereiro de 1919. Membro da direcção da Seara Nova, será chefe de gabinete de Ezequiel de Campos no governo de Álvaro de Castro (1923-24). Após o 28 de Maio de 1926, está implicado no golpe do 3/7 de Fevereiro do ano seguinte, que lhe valerá o exílio, estando na origem do seu exílio no Brasil, onde deixará descendência.

Para além dos aspectos de vida intensamente vivida, Sarmento Pimentel foi um extraordinário escritor, como revelam as suas Memórias do Capitão, cuja primeira edição veio a lume no Brasil pelas mãos do então também exilado Victor Cunha Rego, em 1962. São páginas de grande riqueza estilística, saborosamente evocativas, de travo camiliano.

Num dos poemas que lhe dedicou, Jorge de Sena escreveu: «[...] / Assim, senhor, eu vos saúdo e digo / de como em vida me vivi honrado / com conhecer-vos e por vós ser tido / por digno de amigo e camarada / nas horas duras de se amar a pátria / com amor infeliz, como naquelas / em que de convivência ela renasce / tão pura qual nenhuma pátria humana: / é uma grã-cruz que vossa senhoria / colocou no meu peito e que mais vale / que quantas de vaidade só refulgem. / E pesa como séculos de História / qual em vossas memórias revive. / [...]» 40 Anos de Servidão, 2.ª ed., Lisboa, Moraes Editores, 1982, p. 180.

Dessas Memórias retiro um breve parágrafo em que, a bordo, o jovem alferes de cavalaria ruma a Angola, após o desastre de Naulila de 1914:

«Madrugamos para um último adeus à terra metropolitana, e a brisa do mar refrescou o convés ainda quente daquela noite de Junho, quando chegamos a Cascais.

Rompeu o "Cabo Verde" pelo mar fora, tão calmo e vagaroso como velho andarilho que já soubesse de cor e salteado o caminho a percorrer. Naquele dia perdemos de vista a costa e embicamos ao sul rumo da África, havendo apenas de anormal o barulho dos cascos dos solípedes no assoalho dos porões, muito aumentado quando o clarim tocou para a ração.»

Memórias do Capitão, Porto, Editorial Inova, 1974, p. 143.

Na net:Brasil/Portugal - Testemunhos/Encontros; Câmara Municipal de Mirandela

 
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