domingo, 8 de fevereiro de 2009

poesia de cascais #11 - Vasco Graça Moura



lavadeiras

na estrada velha, perto de minha casa,
há um lavadouro de arcadas azuis. vejo,
às vezes, as mulheres lavando a roupa,
uma ou duas, não mais, pela manhã, de

jeans e camisola, raramente de lenço
na cabeça, raramente olhando para
os carros que passam. como o almada
negreiros tinha casa ali perto, pergunto-

-me se não será ainda uma representação do tipo
gare marítima de alcântara, como a nau catrineta,
o conde ninho, outra coisa qualquer do romanceiro,
esfregada entre água fria e detergente, apenas

para a cor local do sítio de bicesse, enquanto, de
certeza, as mulheres ouvem a lambada, o rap, alguma
rumba antiga ou cantarolam os indicativos dos
anúncios radiofónicos mais estúpidos do mundo,

e os carros passam e repassam, apertando a curva.
alguns desenhos do alamada poderiam explicá-las,
no ritmo íntimo do corpo, mas já sem arabesco integrador
de uma sucessão de gestos na memória colectiva,

mas já sem colorido, já sem alegria ou tristeza,
apenas como banalidade pobre do sítio de bicesse,
atafulhando sacos de plástico com a roupa, e faça sol
ou chuva, para alguém continuar de mãos gretadas.

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